Cinco HQs & Uns Livros: Dicas de Leitura para Janeiro de 2024

Cinco HQs & Uns Livros: Dicas de Leitura para Janeiro de 2024

Caros Aspianos e demais público do blog da ASPAS, chegou a hora das indicações de leituras para o mês de janeiro de 2024, feitas por Guilherme Smee.

CINCO HQs


SANDMAN APRESENTA, VOL. 7: O CORÍNTIO E BAST, DE DARKO MACAN, DANIEL ZEZELJ, CAITLIN R. KIERNAN E JOE BENNETT

Acredito que desta coleção Sandman Apresenta, trazida este ano pela Panini Comics Brasil com base em uma coleção italiana, este volume é o único que tem todas as histórias inéditas no Brasil. São duas minissérie em três edições. Duas história ao bom e velho estilo da Vertigo: adultas com temas maduros, desenhos carregados e acontecimentos que estarrecem os leitores. A crueldade em uma Veneza pós-Primeira Guerra, com a ascensão dos movimentos fascistas é trazia em O Coríntio. Desenvolvida por Darko Macan, que escreveu Cable, e desenhada por Danijel Zezelj, de Loveless e Constantine é uma ótima história de pesadelo na vida real. Outra história nesse sentido é a minissérie de Bast, que de certa forma dá continuidade a Um Sonho de Mil Gatos, Sandman. Escrita por Caitlin R. Kiernan, de O Sonhar e desenhada pelo brasileiro bolsonarista Joe Bennet, ambos conferem o estado quasi-onírico dessa história de mortes e ressurreições, humanos e divindades, promessas e desilusões. Um ótimo volume trazendo um bom exemplo da vanguarda que a Vertigo costumava trazer até ser cancelada pela DC Comics.




INVASÃO SECRETA: MISSÃO TERRA, DE RYAN NORTH E FRANCESCO MOBILI
Quando a Marvel lança alguma produção audiovisual, uma das consequências óbvias é que irá trazer para os quadrinhos algo relacionado com esse título. Embora a série de TV para o Disney+ não tenha conseguido conquistar os espectadores do começo ao final da obra, esta história em quadrinhos prende o leitor de cabo a rabo. Envolvendo os ex-agentes da SHIELD, Nick Fury Jr. e Maria Hill, temos uma ótima série de espionagem levando em conta em quem se pode confiar e se até mesmo podemos acreditar nos nossos sentidos. O roteiro de Ryan North é muito esperto, é rápido, cheio de reviravoltas e com bons diálogos. Já os desenhos de Francesco Mobili se ajustam muito bem com o clima de suspense e de suspeita que se estabelece na história. Muito mais que apenas um produto derivado de uma série malfadada, essa minissérie, completa aqui neste encadernado da Panini é uma boa pedida e, dentro das suas possibilidades, desenvolve melhor que a saga em que foi baseada, porque resolve tudo dentro de uma determinada abrangência de personagens sem querer causar muito alarde ou ser grandiloquente como sua antecessora.




MÁQUINAS DEVEM MORRER, DE DAN AROEIRA
Acompanhei o processo de criação de Machines Must Die, desenvolvido pelo amigão Dan Aroeira. E, pra começar, esse é um elemento que as IAs não podem nos fornecer: o processo por trás da criação de suas imagens e textos, porque eles são apenas códigos binários. O Dan tem sido um aguerrido defensor dos artistas na luta pela conscientização dos perigos das IAs para o futuro. Essa publicação, mais que um quadrinho apenas é um manifesto que traz uma analogia em forma de arte da ameaça que esses robôs, essas "ferramentas" representam para os artífices humanos. Em poucos anos a criatividade poderá se tornar lenda. Por isso, além de explicar desenhando, Dan também traz um material extra nessa publicação com um texto de própria autoria e bem embasado teoricamente, com todas as referências explicitadas. Essa história faz parte, também, da publicação quadrinhos sonoros e foi inspirada na música homônima do mineiro Anderson Noise. Se você busca um material educativo e revelador sobre o uso indiscriminado de AIs, esta é a direção. Além disso, usar AIs é ruim porque o resultado é feio e brega. 'Nuff Said!





JUSTICEIRO, VOL. 3, DE JASON AARON, PAUL AZACETA, JESUS SAIZ, TORUNN GRONBEKK E DJIBRIL MORISSETTE-PHAN
Numa primeira olhada, o leitor comum não conseguirá definir melhor essa fase do Justiceiro como um massaveismo com Frank Castle se tornando um adepto do Tentáculo e cada vez mais aprofundado no culto à Besta e como lutas porra-loucas o tempo todo. Mas aliado a isso tem o lado humano de um homem afetado pela guerra e cuja indiferença pelo mundo começa a prejudicar sua relação com sua família. Talvez não possa parecer, mas é algo que acontece com diversos homens ao redor do mundo que, afetados por guerras ou não, começam a perder o interesse por cuidar da família dando vazão ao lado que faz demostrarem que sejam "verdadeiros homens", apáticos, violentos e sem carinho pelos que deveriam amar. Nesse sentido, essa fase do Justiceiro por Jason Aaron traz tantas camadas do papel do homem na sociedade, que se torna uma das melhores análises do personagem já feitas, por lidar com um elemento constituinte do Justiceiro, mas pouco explorado: como ele trata sua família. Vale dizer também que este encadernado traz o melhor roteiro de Torunn Gronbekk que já li. Não que seja muito difícil.




GOTHAM CITY: ANO UM, DE TOM KING E PHIL HESTER
Apesar de Gotham City: Ano Um ser escrita por Tom King, escritor de quadrinhos badalado dos últimos anos, não vi nenhuma comoção a respeito da minissérie por aí. Mas gostei da premissa: mostrar como o crime e a corrupção começaram na cidade, duas gerações antes do surgimento do Batman. A história é focada em Slam Bradley, detetive particular criado pelos mesmos inventores do Superman. O que me encantou mesmo nessa minissérie foi a tentativa de emular as narrativas noir dos anos 1930 de autores como Mickey Spillane e Raymond Chandler, com um protagonista imponente como Bradley e personagens sem escrúpulos e nem remorsos como os Wayne daquela época. São todos ingredientes que um belo romance noir pede, além de uma polícia não confiável e algumas pitadas de femmes fatales agindo dentro da trama. Mas temos também os plot twists interessantes de histórias clássicas do noir como Chinatown e L. A. Confidencial. Esse quadrinho me fez ficar grudado nele até eu entender todos os mistérios que ele estabelece e desbarata até a última página, mas também acaba deixando alguns na incumbência do leitor.


UNS LIVROS



A CRISE DA NARRAÇÃO, DE BYUNG-CHUL HAN
Byung-Chul Han é definitivamente meu filósofo contemporâneo favorito. Talvez porque tenha uma escrita acessível e esteja antenado com questões essencialmente da contemporaneidade. Em A Crise da Narração, Han aponta outro problema gerado em nosso entendimento de mundo gerado pela internet, a digitalização e a plataformização, a confusão entre narração e storytelling. Além disso, o filósofo opõe narração e narrativa e aproxima storytelling de storyselling, tão apregoado pela publicidade ultimamente. É por causa da crise da narrativa que estamos consumindo cada vez mais mais do mesmo dos produtos culturais que consumimos. Isso porque não consumimos mais a construção do mistério, mas as revelações escancaradas de tudo, uma oposição que Han já fez em outras obras opondo o liso do rugoso, o positivo do negativo e o erótico do pornográfico. Assim, se lidas uma atrás da outra, as obras de Han dão uma dimensão maior de seu estilo, temática e como muitos apontamentos reverberam em diferentes trabalhos. Este livro é mais uma confirmação disso tudo.



QUADRINHOS: PROFISSÃO E TRABALHO CRIATIVO, DE GLEDSON RIBEIRO DE OLIVEIRA
Primeiro eu tinha baixado este livro como PDF no site da Editora Marca de Fantasia. Depois, encontrei ele em formato físico na Comix Book Shop, em São Paulo e aí sim eu fui lê-lo. Achei um ótimo livro, que aponta bastante coisas sobre o mercado de quadrinhos brasileiro. A principal conquista desta pesquisa é indicar como os trabalhadores dos quadrinhos pensam a si mesmos sob qual identidade e as respostas são as mais variadas possíveis, o que mostra como não existe uma consciência de classe sobre esse tipo de trabalho no Brasil. Contudo, acredito que a pesquisa focou muito nos trabalhadores de quadrinhos do nordeste e vinculados com o mercado estrangeiro, principalmente dos Estados Unidos. Acredito que um trabalho que trouxesse realidade das cinco regiões do país poderia ter um resultado diferente. Por sorte e juízo, em nenhum momento o autor propõe a pesquisa como algo que vai trazer a realidade brasileira como um todo. Aliás, o rigor da pesquisa e a escrita certeira são dois grandes pontos desta publicação.

Até o próximo mês!

=)






1 comentários:

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Fiquei bem interessado nesse Gotham, ano Um, pela narrativa noir. Quero muito aprender a fazer algo nesse estilo. :)

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